JOSÉ ORENSTEIN
colaboração para a Folha
MARCUS PRETO
da Folha de S.Paulo
"Já fui sanfoneiro, rei do baião, quase sumi na poeira. Agora, sou lúdico, autêntico. Virei um tal de folclore." Assim Luiz Gonzaga, então com 60 anos de vida, se definia no encarte da série Disco de Bolso do "Pasquim", em 1972.
Paulo Vanderley/Divulgação |
O cantor Luiz Gonzaga em foto tirada no início da década de 1950 |
Agora, 20 anos após sua morte, o "folclore" em torno da figura de Gonzaga pode ser redimensionado. A data redonda reacende, ainda que timidamente, as luzes sobre o artista --raiz da formatação da música popular brasileira no século 20.
Em termos musicais, surgem agora alguns --poucos-- lançamentos em que seu nome está envolvido. O principal é um disco com regravações de valsas que Gonzaga compôs na década de 1940 --algumas ganharam letras inéditas por artistas como Zeca Baleiro, Abel Silva, Fernando Brant e Capinan.
Projetos maiores, no entanto, estão previstos para mais adiante. Ainda sem data definida, um museu dedicado à obra do artista deve ser inaugurado em Pernambuco.
E um longa contando parte de sua história tem estreia programada para 2011 --um ano antes daquele que seria o centésimo aniversário do músico.
Baseado na biografia da jornalista Regina Echeverria, o longa "Gonzaguinha e Gonzagão - Explode Coração" já está em processo de pré-produção. A direção fica aos cuidados de Breno Silveira, o mesmo de "2 Filhos de Francisco".
Como fez no trabalho dedicado a Zezé Di Camargo e Luciano, Breno vai partir da vida real para criar um filme não documental, que pode incluir licenças poéticas. O roteiro, que já está pronto, parte do olhar do filho Gonzaguinha para contar algumas das histórias do pai.
"Gonzaga é nosso primeiro artista pop", diz o diretor. "Com sua música, emendou pela primeira vez as pontas desse país, Nordeste e Sudeste."
Líder da banda Cordel do Fogo Encantado, o pernambucano Lirinha concorda com esse conceito. "Ele era o nosso Elvis Presley", diz. "Antes dele, ninguém por aqui ainda tinha pensado em criar um personagem para fazer música, com conceitos definidos de figurino e tudo mais. Ele inventou isso."
Lenine também considera Gonzaga o precursor do "artista vestido, com música e com luz num ginásio". Além disso, lembra, ele e o letrista Humberto Teixeira "botaram o Nordeste no centro da atenção, no mapa do Brasil". "É um débito que temos com ele", diz.
Rei do Baião
Gonzagão foi realmente popular, de Norte a Sul do país. Mas, entre 1941 e 1945, era proibido de cantar nos próprios discos. Exigência das gravadoras, que então só admitiam cantores "de vozeirão" no primeiro plano. Sua voz foi gravada pela primeira vez em um 78 rotações de 1945. A canção era "Dança Mariquinha", parceria dele com Miguel Lima.
Ainda assim, o baião formatado por ele se manteve entre os ritmos predominantes na música brasileira entre aqueles anos 40 e o surgimento da bossa nova (de que, aliás, Gonzaga também foi influência), no final da década seguinte.